Justiça para a Biodiversidade: o caminho a seguir para a vida na terra

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Em 2010, enfrentamos uma combinação de crises de biodiversidade, alimentos, combustíveis, econômica e climática. A conservação e o uso sustentável da biodiversidade é fundamental para abordar essas crises e planejar um caminho verdadeiramente sustentável para a humanidade.

Em Nagoya, os governos estão reunindo-se para uma negociação internacional fundamental da Convenção sobre Diversidade Biológica (CBD), com a esperança de deter as contínuas perdas de biodiversidade - a essência da vida. Desde o começo da CBD em 1992, os governos não têm conseguido avançar muito, com o consenso científico de projeções de mais perda de hábitat e altas taxas de extinções, incluindo perdas de variedades de alimentos e animais, com conseqüências drásticas para as sociedades humanas. Enquanto a CBD é às vezes descrita como um grande compromisso entre o Norte e o Sul (os chamados desenvolvidos e em desenvolvimento), o Norte não tem cumprido sua parte da promessa, especialmente em termos de recursos financeiros, e também a falta de progresso sobre o assunto crítico de acesso e divisão de benefícios de recursos genéticos (ABS).

Em Nagoya, os governos vão convir em deixar as coisas como estão quanto ao crescimento econômico e o consumo excessivo, submetendo-se a oportunidades de mercado e consertos técnicos? Ou vão convir em abordar realmente as causas de fundo da perda de biodiversidade e estabelecer um novo caminho corajoso que defenda e apóie os custódios da biodiversidade - Povos Indígenas, comunidades locais e fornecedores de alimentos em pequena escala, como granjeiros, pescadores e pastores?

Durante os dois meses passados, grupos da sociedade civil do mundo inteiro têm estado discutindo, debatendo e chegando a acordos quanto ao que acreditam que são os assuntos fundamentais para a COP de Nagoya.  Convocamos as Partes para fortalecer (não debilitar) os princípios fundamentais da Convenção -como o enfoque de ecossistema, o princípio precautório, e um entendimento que a biodiversidade não pode separar-se daqueles humanos que a nutrem, a defendem e a usam sustentavelmente. As partes deveriam afastar-se do enfoque de mercado de outros acordos, como a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática, e não permitir que os acordos de biodiversidade sejam condescendentes com outros acordos internacionais, incluindo o comércio.

Em vez disso, as Partes deveriam adotar um enfoque de justiça de biodiversidade, que significa não somente sustentar os direitos, dignidade e autonomia de todos os povos, mas também respeitar os direitos de todos os seres vivos. Um enfoque de justiça para a biodiversidade coloca os custódios da biodiversidade no centro da criação de políticas, e como os beneficiários mais importantes das políticas de biodiversidade. Essas comunidades fundamentais e seus sistemas de conservação e manejo deveriam ser recompensados, não transformados em mercadorias nem forçados em agendas econômicas neoliberais.

Muitos grupos da sociedade civil do mundo inteiro se têm reunido para criar um conjunto de 10 informações coletivas: os “10 Principais temas para COP 10”. Na próxima página salientamos nossas principais demandas.

Grupos da sociedade civil exigem os seguintes compromissos em Nagoya:

1. As partes precisam urgentemente cumprir suas obrigações como signatários da Convenção sobre Diversidade Biológica e convir em um forte e ambicioso plano estratégico; esse plano deve conter objetivos que:

• integrem a biodiversidade e sua função central no funcionamento e resiliência dos ecossistemas em instituições e acordos internacionais, especialmente de comércio, e também em políticas nacionais, incluindo desenvolvimento econômico e prestação de contas

• eliminem subsídios e incentivos perversos que danificam a biodiversidade até 2020 (particularmente para petróleo e gás, agricultura, agocombustíveis/bioenergia, pesca)

• reduzam o desmatamento e a destruição de hábitats naturais a zero até 2020

• acabem com os padrões atuais de produção e consumo insustentáveis

• acabem com a pesca excessiva e práticas de pesca destruidoras

• façam com que a agricultura, o florestamento e outros usos da terra sejam sustentáveis e reduzam a acumulação de nutrientes por baixo dos níveis de acumulação críticos

• atinjam um sistema representativo de áreas protegidas com base na participação plena e efetiva de Povos Indígenas e comunidades locais e respeito por seus direitos (incluindo consentimento livre, prévio e informado)

• aumentem o financiamento público dez vezes

• defendam e aumentem a representação genuína na tomada de decisões de conservadores, usuários e desenvolvedores de biodiversidade locais

2. As partes precisam adotar um Protocolo ABS legalmente obrigatório que vai ter fortes medidas de aplicação e cumprimento, que possa deter a biopirataria, respeite e proteja os direitos dos Povos Indígenas e das Comunidades Locais e questione a primazia das regras de propriedade intelectual. O Protocolo ABS também deveria garantir benefícios reais e atuais para os Povos Indígenas e as comunidades locais e que o Protocolo não resultará em maior privatização de recursos genéticos e monopólios sobre tecnologias.

3. As partes deveriam abordar as causas subjacentes da perda de biodiversidade, começando com a eliminação de subsídios perversos que promovam a expansão de monoculturas, bioenergia, biomassa e outras mercadorias.

4. As partes deveriam evitar enfoques de risco não provados, como os mercados de compensação de carbono das florestas (por exemplo, no REED), compensações de biodiversidade e Mecanismos de Desenvolvimento Verde que carecem de salvaguardas apropriadas para a biodiversidade e para os direitos dos Povos Indígenas e Direitos Humanos.

5. As partes deveriam adotar e apoiar uma moratória sobre o desenvolvimento, prova, lançamento e uso de novas tecnologias que apresentam potenciais ameaças à biodiversidade, incluindo geoengenharia e biologia sintética.

6. As partes deveriam focalizar-se na implementação de decisões, desenvolvendo mecanismos de cumprimento e aplicação.

7. As partes deveriam colocar aos reais custódios da biodiversidade no centro da cena na implementação da Convenção e na tomada de decisões. Isso inclui a adoção de um novo programa de trabalho para melhorar o manejo consuetudinário dos recursos e o uso sustentável.

8. As partes deveriam estabelecer uma definição de florestas e manejo sustentável das florestas que exclua as plantações de monoculturas de árvores e evite a invasão de espécies exóticas, em linha com os objetivos e princípios da CBD que inclua os direitos das comunidades ao acesso, controle e governo de florestas;

9. As partes deveriam defender e proteger os pequenos granjeiros e camponeses, pastores, pescadores e outros fornecedores de alimentos em pequena escala que conservam e desenvolvem a biodiversidade agrícola, garantindo assim os futuros alimentos. Fazendo isso, devem proibir quaisquer sistemas, métodos, processos ou tecnologias que poderiam danificar a biodiversidade e funções do ecossistema relacionadas em ecossistemas manejados.

10. As partes deveriam chegar a um acordo para melhorar o apoio, manejo e governo de áreas protegidas existentes e garantir que quaisquer novas áreas protegidas se baseiem em participação completa e efetiva de Povos Indígenas e comunidades locais e respeito por seus direitos (incluindo o consentimento livre, prévio e informado).

11. As partes deveriam chegar a um acordo para expandir as áreas protegidas (terrestres e marinhas) para incluir uma maior representação da biodiversidade. Quaisquer novas áreas protegidas não devem fazer parte de programas de compensação da biodiversidade ou outros programas de compensação que permitam que as práticas atuais continuem em outros lugares.

COP 10 deve ser a virada para a política sobre biodiversidade. Precisamos fortalecer e renovar esforços para conservar e usar a biodiversidade de forma sustentável e garantir o fluxo de benefícios para aqueles que a nutrem. Precisamos fortalecer a função da CBD na política internacional e fortalecer sua implementação em todos os níveis. A Sociedade Civil faz um chamamento às partes para tomar cuidado desses imperativos em benefício da humanidade e de todos os seres vivos.