Não a Monsanto! Não aos venenos! As plantações industriais de árvores e os agrotóxicos


Há décadas que o Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais (WRM) vem denunciando as muitas formas como as plantações industriais de árvores são uma causa direta da contínua destruição da vegetação, da biodiversidade e das florestas. Em consequência, as plantações de árvores industriais provocam também a perda da soberania alimentar, dos meios de vida, culturas e inclusive a existência de muitas comunidades que dependem da floresta. Denunciamos o envenenamento devastador que estes monocultivos, sem exceção, produzem no solo, no ar, nas fontes de água e na saúde das comunidades afetadas ao utilizar agrotóxicos de forma indiscriminada.

Neste contexto, a empresa Monsanto, dos EUA do ramo do agronegócio químico, em conjunto com outras empresas do mesmo ramo, se apresenta como um ator central na luta contra as plantações de árvores. Seu famoso produto Roundup, a herbicida mais utilizada no mundo a base do glifosato, causa consequências sanitárias/ambientais a nível mundial. Esta herbicida altamente tóxica é utilizada nas plantações de árvores para matar qualquer planta que pudesse competir ou afetar a árvore cultivada. Além disso, existem altos riscos relacionados à intensificação do uso de agrotóxicos nas plantações de árvores transgênicas, cuja aprovação já foi dada no Brasil e nos EUA.

Por estas razões, o WRM apoia o Tribunal Internacional contra a Monsanto que vai acontecer entre 14 e 16 de outubro em Haia, Holanda. Trata-se de uma iniciativa que busca responsabilizar a gigante da indústria agroquímica por violações em direitos humanos, crimes contra a humanidade e ecocídios (http://www.monsanto-tribunal.org/).

As plantações não são florestas!

À continuação compartimos uma entrevista com Ivonete Gonçalves de Souza, a Coordenadora Executiva do Centro de Estudos e Pesquisas para o Desenvolvimento do Extremo Sul da Bahia (CEPEDES) e integrante da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida.

1. É cada vez mais divulgado e de conhecimento público que agrotóxicos são usados na agricultura. Mas ainda há pouca divulgação e, portanto, há pouco conhecimento público que se usa também venenos nas plantações industriais de árvores. Por que?

Muito simples. Quando se fala de venenos, de agrotóxicos, as pessoas remetem aos alimentos visto que já está bem divulgado, até o maior canal de televisão do Brasil, divulga sobre o assunto. Mas como soja, café e eucalipto não são considerados alimentos, a questão fica invisível para grande parte da população. Nas plantações de árvores principalmente. Não se tem divulgado o uso de substâncias químicas no eucalipto e isso é muito grave. Usa-se grandes quantidades de substâncias e também muitas misturas. Os estudos de substâncias individuais apontam consequências graves, mas não há estudos claros, divulgados amplamente sobre o que significam a mistura de diversos produtos. A produção de eucalipto, em grande escala, na região do extremo sul da Bahia, Brasil, é da década de 1980. Imaginem quase quatro décadas de veneno. O que isso significa? O que sabemos é que a população e também os solos, as fontes de agua e a vegetação estão cada dia mais expostas e consequentemente envenenadas!

2. As empresas que promovem a monocultura de árvores costumam dizer que aplicam produtos de “baixa toxicidade”, que são “defensivos agrícolas”, não venenos. Dizem ainda que utilizam muito menos agrotóxicos, se comparado com cultivos como café ou a soja, e que está tudo dentro das “normas” legais. As empresas afirmam ainda que aplicando os produtos “corretamente”, não há impactos negativos. O que você que estudou os impactos dos agrotóxicos na monocultura de eucalipto tem a dizer sobre este discurso das empresas?

Trata-se de manipulação ideológica disseminada principalmente pelas grandes indústrias, como a Monsanto, responsáveis pelas substâncias químicas. Não existe veneno de baixa toxicidade, muito menos defensivos agrícolas. As substâncias químicas foram criadas inicialmente para matar. Foram utilizadas nas guerras e somente mais tarde ganharam status de “defensivos agrícolas” para vender aos países subalternos como o Brasil. E mesmo porque as formigas, e as poucas espécies de plantas que insistem em quebrar a solidão dos eucaliptos, são consideradas entraves da monocultura de árvores, e não dão trégua. A formiga constantemente presente, e, em grande quantidade é o sinal que a natureza dá quando um ecossistema está desequilibrado. As formigas se alimentam da fartura das folhas novas de eucalipto num “mar” de milhares hectares de eucalipto, sem inimigos naturais para controlar a população de formigas visto que outros insetos não conseguem sobreviver no ambiente degradado e envenenado. Então são constantes, pois, monoculturas são com certeza uma das mais violentas práticas para o desequilíbrio da natureza. Usar veneno “corretamente”, existe? Na verdade o que ocorre é o envenenamento da população através da água, do ar e do solo, em doses homeopáticas, em silêncio.

3. Um dos grupos de agrotóxicos mais utilizado no eucalipto são as herbicidas, entre elas o glifosato, conhecido como o Roundup, que é produzida pela Monsanto. Quais os impactos da aplicação deste produto, em especial sobre a saúde do trabalhador e da comunidade vizinha da plantação, seu território e fontes de água?

Além do herbicida glifosato, patenteado pela Monsanto até o ano 2000, em diversas formulações, outras substâncias combinadas são utilizadas, como o oxifluorfem, para matar o mato. Na medida em que as plantas e os insetos vão criando resistência, as mesmas necessitam de doses maiores e misturas de produtos. É a ordem natural. Isso representa um ganho global, no sentido de que um ramo da economia sempre incide fortemente sobre o outro. Neste caso, as empresas que plantam eucalipto incidem positivamente sobre a indústria de agrotóxico. E vice versa. E, ao mesmo tempo que são utilizados os produtos químicos para matar o mato, em outra área as empresas certamente estão jogando alguma substância para matar formigas, a base de sulfluramida. Esse também é um produto perigoso, pois ao se degradar no ambiente se transforma em outra substância muito mais perigosa, o sulfonato de perfluorooctano (PFOS). O desequilíbrio provoca o aparecimento de outras pragas. Por exemplo, a região do Extremo Sul da Bahia, com cerca de quase um milhão de hectares de eucalipto pertencentes a quatro empresas (FIBRIA - a ex-Aracruz Celulose - , a Suzano Bahia Sul, a Arcelor Mittal e a Veracel Celulose), foi infestada pela lagarta parda do eucalipto e tem provocado prejuízos para as empresas. Esta lagarta também se transforma em mariposas e invadem cidades, assentamentos, comunidades, aldeias. Então outros produtos são utilizados, inclusive pulverização aérea de produtos tóxicos de substâncias diversas. Há depoimentos de diversos trabalhadores impactados pelos venenos. Há depoimentos de morte por envenenamento de agrotóxicos dos trabalhadores. Mas ainda é um tema pouco estudado e divulgado, assim como os impactos nas comunidades. A Campanha Permanente contra os Agrotóxicos no Brasil produziu um dossiê excelente sobre este tema que recomendo a tod@s consultar (http://abrasco.org.br/dossieagrotoxicos/)

4. Hoje, o Brasil é o primeiro país na América Latina que aprovou o plantio comercial de um eucalipto transgênico. No caso dos cultivos transgênicos como da soja, Monsanto prometeu que a soja transgênica ia precisar menos glifosato se comparado com a soja convencional. No entanto, estudos comprovam que na prática aconteceu o contrário. O que esperar do eucalipto transgênico em relação à aplicação de agrotóxicos?

Certamente vai acontecer a mesma coisa. Essas empresas se sustentam na mentira, na certeza da impunidade e na força do poderio econômico. Elas se apoiam no Estado, mas também na ciência hegemônica. Há estudos independentes no mundo inteiro dizendo que o glifosato é perigoso e as empresas continuam dizendo que se trata de um mito. Basta ver as páginas dessas empresas na internet. Vejam o site da Monsanto: http://www.monsanto.com/global/br/produtos/pages/mitos-verdades-glifosato.aspx
O eucalipto transgênico vai demandar mais veneno, até porque essa é uma estratégia maléfica para sustentar as indústrias, aumentar os lucros. Como eu disse antes, um setor beneficia o outro. Ou seja, um setor somente sobrevive porque o outro alimenta. Veja que a Monsanto, que virou gigante vendendo o glifosato para o mundo, agora vai se juntar com a empresa farmacêutica e química alemã Bayer. Casamento perfeito! Antes, a Monsanto vendia e fazia lucro com o veneno usado na agricultura e a Bayer ganhava dinheiro e fazia lucro vendendo os “remédios” da farmácia para tratar as doenças que resultam do veneno. Agora estas duas se juntam. O eucalipto transgênico é mais uma estratégia do mercado para alimentar a fome de mais capital. Maior produção de veneno, mais venda e maior produção e venda de celulose.

5. As plantações de monocultivos de árvores que são certificadas, com selos como por exemplo do FSC, declaram o manejo dessas plantações como “sustentável”. Mas nessas plantações certificadas são aplicados agrotóxicos também. Como então isso pode ser considerado “sustentável”?

Eu estou certa hoje de que os selos só servem para iludir o povo, em especial o povo dos países do Norte! Porque o FSC, por exemplo, tem conhecimento de toda a cadeia de malefícios causados pelas monoculturas de árvores. Temos prova disso. Um exemplo é que o FSC tem toda uma lista de produtos que não devem ser utilizados nas plantações certificados, como o sulfluramida. No entanto, ela se finge de morta e dá selo para empresas que plantam árvores e utilizam um ou mais destes produtos. Diversas vezes foram denunciados os crimes ambientais e sociais causadas pelas empresas de eucalipto ao FSC. E o que FSC fez ou faz? Mantém o selo para as empresas. É uma maquiagem de “sustentável”. Aliás, a certificação é “sustentável” só para o FSC e para a empresa que faz o processo de certificação.

6. Por fim, como romper com, como você escreve no seu estudo, o “ensurdecedor silêncio” sobre a utilização de agrotóxicos na monocultura de eucalipto?

Primeiro passo é trazer à tona essa problemática. Divulgar o máximo. Pois, os produtos utilizados são diversos, usados em grandes quantidades, ininterruptamente e se deslocam a grandes distâncias pelo ar e pela água principalmente. Então, estamos todos, sujeitos às intempéries causadas pelos venenos, independente de onde estamos visto que água e ar não tem fronteiras. Devemos fazer uma campanha acirrada neste sentido. E não somente por nós, mas pelas futuras gerações. Não é justo para com as futuras gerações, receber um planeta envenenado como herança.

Segundo, no caso do Brasil, é destinar as áreas com plantios de eucalipto, na maioria terras devolutas, do estado, para reforma agrária, para plantio de alimentos de base agroecológica como produção de vida e saúde para todas as espécies do planeta.