A agenda da empresa de plantações de árvores Suzano na COP26 do clima da ONU: expansão, árvores transgênicas e certificação pelo FSC

Imagem
Foto: A. Wilson

A Suzano esteve presente nas negociações climáticas da ONU de 2021 por um motivo principal: promover as plantações de árvores como uma “solução” para as mudanças climáticas, com o nome de “soluções baseadas na natureza”. Da energia de biomassa, passando pelas plantações para sequestro de carbono, até as árvores transgênicas, a empresa busca lucrar cada vez mais com as chamadas políticas climáticas.

Quem chegava à estação ferroviária de Glasgow em novembro de 2021, para participar da COP26, a reunião climática da ONU, recebia exemplares do Financial Times com um anúncio na primeira página da Suzano, a gigante brasileira de celulose e papel. “Apoiamos um mercado de carbono regulamentado para cumprir o Acordo de Paris”, afirma o anúncio. (1)

Em uma lista de tópicos, a maior produtora mundial de celulose de eucalipto afirma que a rápida descarbonização exige “a construção de um mercado de carbono regulado e verdadeiramente global”. A Suzano se descreve como uma “empresa negativa em carbono” que “demonstrou que é possível realizar mudanças positivas hoje”.

E a empresa anuncia sua meta de chegar a “uma remoção líquida de 40 milhões de toneladas de carbono da atmosfera” até 2025.

Na COP26, Walter Schalke, CEO da Suzano, disse à coalizão “Business for Nature” que “a biomassa vai transformar o futuro”. (2) Segundo Schalke, sua empresa “pode fazer parte da solução para as mudanças climáticas, porque [está] nos dois lados da equação: de um lado, absorvendo carbono e, do outro, substituindo materiais fósseis”.

A realidade é que a queima de biomassa para produzir eletricidade está crescendo muito, pelo menos em parte, porque a ONU considera a biomassa como uma fonte de energia neutra em carbono. Isso permite que países e empresas queimem biomassa sem ter que contabilizar as emissões, contribuindo para o cumprimento de suas metas de redução de carbono. Mas a expansão das plantações industriais de árvores e a queima de ‘pellets’ de madeira são altamente prejudiciais para o clima e para as comunidades que dependem da floresta.

Além disso, a Suzano é responsável por uma grande apropriação de terras no Brasil, incluindo territórios de Povos Indígenas. A empresa espera continuar expandindo suas plantações de monoculturas sob o pretexto das “soluções baseadas na natureza”. Outra tática fundamental para a Suzano continuar expandindo suas plantações de eucalipto é se vender como uma empresa que pratica “conservação” e “restauração”. Isso oculta seu histórico desastroso em relação à floresta e seus habitantes.

A Suzano e as monoculturas de eucalipto

Em 2019, a Suzano Papel e Celulose se fundiu à Fibria para formar a Suzano SA. (3) A Fibria era uma empresa resultante de uma fusão anterior, entre a Aracruz Celulose e a Votorantim Celulose e Papel, uma das indústrias de celulose e papel mais polêmicas do Brasil. (4)

A Suzano tem capacidade para produzir 11 milhões de toneladas de celulose e 1,4 milhão de toneladas de papel por ano. Suas exportações anuais somam 4,5 bilhões de dólares. A empresa possui um total de 2,4 milhões de hectares de terras em sete estados brasileiros (Espírito Santo, Bahia, Maranhão, Ceará, Pará, Mato Grosso do Sul e São Paulo), dos quais cerca de 1,5 milhão consistem em monoculturas de eucalipto de crescimento rápido.

O impacto das vastas plantações da Suzano sobre as comunidades e o meio ambiente em torno delas é grave. Riachos e cursos d’água já secaram, e as condições de trabalho são terríveis. (5) As plantações que a Suzano assumiu no Espírito Santo, ao se fundir com a Fibria, estão em terras pertencentes aos povos indígenas Tupiniquim e Guarani. Após 40 anos de luta, os indígenas conseguiram recuperar 18.070 hectares. (6) As plantações também ocuparam terras de comunidades quilombolas. Além disso, a Suzano assumiu uma participação de 50% da Fibria na Veracel, passando a ser coproprietária, com a Stora Enso, de plantações localizadas em terras do Povo Indígena Pataxó na Bahia.

Em seu site, a empresa afirma que está em busca de “possibilidades de geração de créditos de carbono por projetos florestais (eucalipto e nativas) e de engenharia”. (7)

A Suzano afirma que, em 2020, suas plantações industriais de árvores retiraram um total líquido de 15 milhões de toneladas de CO2 da atmosfera. A empresa afirma que esses números foram confirmados por um “terceiro”, mas não dá detalhes sobre como eles foram calculados. A empresa não explica quanta destruição de biodiversidade, solo e cultura essas plantações já causaram, quanta poluição foi gerada devido às grandes quantidades de agrotóxicos usados ​​nelas, às máquinas pesadas de corte e transporte, bem como às fábricas de celulose e às infraestruturas relacionadas, nem quanta violência as plantações já causaram a indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais.

O fato de a Suzano estar na COP26 promovendo os mercados de carbono ilustra o quanto as plantações de árvores se tornaram uma oportunidade de negócios no novo “pacote climático”.

A Suzano e as árvores transgênicas

Em 2010, a Suzano comprou uma empresa registrada no Reino Unido, chamada FuturaGene, que desenvolve pesquisas com árvores transgênicas.  (8) Uma empresa chamada Suzano Trading Ltd, registrada no paraíso fiscal das Ilhas Cayman, é proprietária da FuturaGene. (9)

Um folheto explica que “A FuturaGene obteve, em 2003, o evento H421 de eucalipto geneticamente modificado, desenvolvido para aumentar o acúmulo de biomassa”. (10) A empresa alegou que essa árvore transgênica seria 20% mais produtiva. Em 2015, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança do Brasil (CTNBio) aprovou o pedido da Futuragene para o uso comercial do eucalipto H421.

Embora a Suzano afirme que isso tornará suas plantações industriais de árvores mais eficientes, a realidade é que as árvores de crescimento mais rápido usarão ainda mais água subterrânea. E o aumento dos lucros da Suzano, junto com suas ambições de produzir biomassa, bem como de papel e celulose, representarão um grande crescimento na área de plantações da empresa. Ela continua se expandindo, e está construindo outra grande fábrica de celulose com capacidade de produção anual de 2,3 milhões de toneladas no Mato Grosso do Sul. Isso resultará em ainda mais terras convertidas em plantações de monoculturas de árvores naquele estado e em seus arredores.

Até agora, porém, a FuturaGene está perdendo dinheiro. Em 2019, a empresa teve prejuízo de 13,3 milhões de libras esterlinas (cerca de 17,6 milhões de dólares). No ano seguinte, o prejuízo foi de 8,9 milhões de libras (cerca de 11,7 milhões de dólares). No total, a FuturaGene custou à Suzano SA cerca de 121 milhões de libras (cerca de 160 milhões de dólares).

Uma entrevista do CEO da FuturaGene Stanley Hirsch, em 2016, ilustra a ambição de sua empresa. (11) Hirsch fala sobre uma “grande oportunidade para o setor de biotecnologia industrial”. E revela a gigantesca apropriação de terras que sua empresa almeja:

“Acho que parte da solução é analisar onde temos terras degradadas. Existem cerca de dois bilhões de hectares de terras degradadas, agrícolas e florestais em todo o mundo, e 75% disso está na África. Essa é uma oportunidade imensa, tanto em termos de possibilidades econômicas quanto de manutenção da sustentabilidade do planeta.”

Durante a COP26 em Glasgow, no Brasil, a CTNBio aprovou o evento 751K032 de eucalipto transgênico para “sua liberação no meio ambiente, seu uso comercial e quaisquer outras atividades relacionadas a esse OGM e qualquer progênie dele derivada”. A Suzano solicitou à CTNBio a aprovação desse novo eucalipto transgênico resistente ao glifosato.

O uso de agrotóxicos já é um grande problema onde se instalam as monoculturas. Solos, água, biodiversidade, trabalhadores e comunidades sofrem com a contaminação. O eucalipto transgênico resistente ao glifosato levará a um aumento no uso de herbicidas nas monoculturas da Suzano. Os impactos da contaminação também aumentarão.

A Suzano e o FSC

Apesar dos impactos ambientais e sociais das operações da Suzano, as plantações da empresa são certificadas pelo FSC (Forest Stewardship Council, em português: Conselho de Manejo Florestal) como sendo bem manejadas. (12)

Os padrões do FSC proíbem o uso de organismos geneticamente modificados. Mas o FSC conseguiu se esquivar do fato de a Suzano ter investido grandes somas de dinheiro em árvores transgênicas, com a clara intenção de usá-las comercialmente. (13) O FSC argumenta que,

“A permissão para utilizar comercialmente o clone GM não coloca a Suzano em conflito com as regras do FSC, desde que não faça uso dela. No entanto, se a Suzano continuar com o plantio de árvores transgênicas para fins comerciais, o FSC iniciará um processo formal dentro de sua Política de Associação, levando à dissociação em relação à empresa”.

A Suzano tem feito lobby junto ao FSC para que abrande ainda mais sua posição sobre as árvores transgênicas e permita que empresas certificadas as plantem. O FSC realizou recentemente uma consulta sobre abrandar sua política sobre árvores transgênicas. O Global Justice Ecology Project elaborou um abaixo-assinado se opondo às mudanças propostas. (14)

Em seu Relatório Anual de 2019, a FuturaGene explica que (15),

“Devido aos problemas contínuos com a obtenção de certificação de produtos de Organismos Geneticamente Modificados (“OGM”) do Conselho de Manejo Florestal (FSC), considera-se improvável que haja uma grande utilização comercial do produto antes de 2022.”

Mas em seu Relatório Anual de 2020, a Futuragene não menciona o FSC e afirma simplesmente que,

“A utilização comercial do H421 (a tecnologia desenvolvida pelas subsidiárias da empresa) já começou.” (16)

As plantações da Suzano continuam certificadas pelo FSC.

A Suzano está cada vez mais próxima das plantações comerciais de eucaliptos geneticamente modificados. Portanto, assim vão ser as “soluções baseadas na natureza”. Vastas áreas de monoculturas transgênicas, cultivadas para gerar lucros para empresas.

Para as empresas de plantações industriais de árvores, a COP26 foi uma oportunidade de fazer lobby para acelerar a “economia de baixo carbono” com o plantio de mais árvores! Os mercados de carbono e as táticas de lavagem verde perpetuam as relações de exploração e discriminação inerentes à produção em escala industrial. As pessoas que vivem e dependem dos territórios sacrificados por essa chamada “economia de baixo carbono” industrial têm que arcar com o fardo mais pesado.

Chris Lang
https://REDD-Monitor.org

(1) Lauren Gifford, The Financial Times, with a laminated pro-compliance market cover advertisement from Suzano, being handed out to COP26 attendees at the Glasgow train station. novembro de 2021, Twitter
(2) Business for Nature,  target="_blank" rel="noopener">COP26 Nature’s Newsroom: Walter Schalka (CEO, Suzano), novembro de 2021
(3) Suzano
(4) Brazil: Aracruz – Sustainability or business as usual?, 2005; Brazil: Quilombolas protest against Aracruz Cellulose, 2005, ; e Brazil: Worked to death by Aracruz, 2005
(5) Brazil: Worked to death by Aracruz, 2005
(6) Aprendizagens de lideranças indígenas Tupinikim do Brasil sobre a retomada de seus territórios: uma luta de mais de 40 anos, Boletim do WRM, 2021
(7) Suzano, Central de indicadores
(8) Futuragene Limited, Overview
(9) Futuragene Limited, People
(10) Futuragene, Innovation is Action; and International Service for the Acquisition of Agri-Biotech Applications, Event Name: H421
(11) GlobalBiotechRevolution,  target="_blank" rel="noopener">GapSummit 2016 – Entrevista com o dr. Stanley Hirsch, 2016
(12) Certificados do FSC– Suzano: https://info.fsc.org/details.php?id=a0240000005sSqiAAE&type=certificatehttps://info.fsc.org/details.php?id=a0240000005uzwTAAQ&type=certificatehttps://info.fsc.org/details.php?id=a0240000008fRYJAA2&type=certificatehttps://info.fsc.org/details.php?id=a02f300000jmYnSAAU&type=certificate; e https://info.fsc.org/details.php?id=a024000000H4SozAAF&type=certificate
(13) FSC, Application of Suzano for commercial use of genetically modified trees
(14) The Campaign to STOP GE Trees, FSC Petition Demands Strong GE Tree Ban
(15) Futuragene, 2019
(16) Futuragene, 2020https://stopgetrees.org/new-fsc-petition-demands-strong-ge-tree-ban-sign-by-dec-14/