As compensações ambientais no Panamá: uma estratégia que abre áreas protegidas à mineração

A empresa Minera Panama (MPSA), de propriedade da canadense First Quantum, tem uma licença para explorar cobre a céu aberto em 13.600 hectares dentro de uma área protegida no distrito panamenho de Donoso, na província de Colón. Além disso, a empresa construiu um porto de águas profundas no Mar do Caribe, que ocupa uma área de 200 hectares e pelo qual o mineral sairá do país, além de uma usina a carvão para fornecer energia a suas operações. A concessão está localizada a cerca de 120 km a oeste da Cidade do Panamá. Para obter as licenças ambientais, a empresa apresentou planos de “compensação pela perda de biodiversidade”.

Quem é a First Quantum?

Em 2013, essa empresa canadense comprou 80% do capital acionário da Minera Panama SA (MPSA), que pertencia majoritariamente à canadense Inmet Mining/Petaquilla, a qual já tinha a concessão para explorar cobre e ouro na região. Como a grande maioria das empresas canadenses que operam na América Latina, a First Quantum tem um histórico de acusações de violação aos direitos humanos em outros países onde já operou. Um relatório das organizações OECD Watch, Oxfam Canadá e DECOP, uma organização de Zâmbia, denunciou que a empresa esteve envolvida, naquele país, na expulsão de moradores de uma área que tradicionalmente haviam ocupado, causando sérios danos às comunidades. Outro relatório afirma que, em 2002, a empresa esteve envolvida na exploração ilegal dos recursos naturais na República Democrática do Congo, na África (1).

No Panamá, a concessão de mais de 13 mil hectares está localizada no Corredor Biológico Mesoamericano, uma conexão regional que será gravemente prejudicada pela mineração de cobre da MPSA. Trata-se de florestas em excelente estado de conservação, que abrigam uma incrível riqueza em termos de biodiversidade. A maioria da população adjacente é de pequenos agricultores e indígenas que se dedicam à agricultura de subsistência e à pecuária.

Os povoados vizinhos já viveram os impactos da mineração na própria carne, pois a Petaquilla Ouro operava na mesma região e, em seus 100 hectares de concessão, causou poluição de rios, desmatamento, impactos na saúde das comunidades, para não mencionar as centenas de promessas não cumpridas. A empresa se envolveu em um escândalo financeiro e foi abandonada, deixando pelo caminho fendas abertas e piscinas com cianeto que ainda hoje são uma ameaça latente a rios e pessoas na região, além de milhares de trabalhadores com salários e outras obrigações trabalhistas não pagas por parte da empresa.

A compensação de danos incompensáveis

A Minera Panama/First Quantum tem obrigação de fazer a compensação das perdas irreparáveis ​​que a extração de cobre em grande escala irá gerar ao meio ambiente, de acordo com as exigências que o governo lhe fez para dar as licenças ambientais. A empresa está empenhada em seguir as normas exigidas pela Corporação Financeira Internacional (IFC, na sigla em inglês), braço privado do Banco Mundial, e apresentou planos para de “compensação pela perda de biodiversidade”.

A mina ainda não começou a operar. No entanto, talvez para apaziguar ONGs conservacionistas que promoveram a declaração do Corredor Biológico Mesoamericano como área protegida e as vozes dos moradores locais que se opõem à destruição maciça que o projeto irá gerar, montou uma forte campanha para promover suas atividades. Ela inclui vários programas como parte de sua estratégia de compensação. De acordo com sua página na internet, a empresa “se compromete a manter um impacto líquido positivo sobre a biodiversidade e ser uma líder mundial na gestão de biodiversidade”.

No final de 2016, o WRM fez uma visita à região para conversar com os moradores e conhecer em primeira mão o que acontece em nível local.

Entre os planos de compensação pela perda de biodiversidade previstos pela empresa está o reflorestamento de 7.300 hectares. Essa plantação serviria para compensar perdas irremediáveis que o projeto de mineração irá gerar na região do Corredor Mesoamericano. Os moradores locais com quem conversamos na zona de Coclecito sabiam que a empresa estava levando a cabo planos de reflorestamento. Apesar da grande publicidade na página da empresa, durante a visita, mal conseguimos ver alguns pés de café e algumas árvores nativas plantadas na borda íngreme da estrada.

Na lógica da compensação, absurda por si só, parece ainda mais difícil imaginar uns poucos pés de café e algumas árvores para compensar a perda das florestas da região, que fornecem abrigo a uma grande variedade de fauna e flora, incluindo espécies endêmicas ameaçadas de extinção e que também são importantes para as comunidades locais que as usam diariamente. (2)

Além disso, como é evidente que os habitats de várias espécies que habitam a área serão destruídos, a empresa fez acordos com organizações internacionais na tentativa de salvar algumas dessas espécies – e de melhorar sua imagem. Por exemplo, sua associação com a organização Sea Turtle Conservancy procura proteger tartarugas marinhas ameaçadas de extinção, as quais nidificam precisamente na costa caribenha que será afetada pelo porto de águas profundas a ser usado para retirar o minério.

Outro dos planos de compensação que a empresa apresentou trata de apoiar a gestão de áreas protegidas em torno da concessão Parque Santa Fé Park e Omar Torrijos, assim como a criação de uma terceira área de uso múltiplo em Donoso, totalizando cerca de 250 mil hectares. A Minera Panama diz que vai cobrir os custos de equipamento, infraestrutura, monitoramento biológico, educação e programas de treinamento que beneficiem todos os guardas florestais em áreas protegidas do Panamá.

Aqui reside outra das grandes falácias dos mecanismos de compensação. As empresas nem deveriam elaborar seus próprios planos de compensação, porque descobriram uma maneira que as exime da responsabilidade de implementar um projeto de compensação e, mais importante, do custo de manutenção desses projetos, principalmente quando a mina deixar de funcionar.

Além disso, um dos conceitos subjacentes à compensação é que esses projetos devem ser “adicionais”, ou seja, os promotores de um projeto de compensação devem demonstrar que, se não fosse por ele, a área que agora procuram conservar teria sido destruída, o que não é o caso das áreas protegidas.

Usando métodos ilegítimos, como é a compensação de danos incompensáveis, a Minera Panama está se preparando para abrir e destruir as florestas panamenhas localizadas no Corredor Biológico. Os mecanismos de compensação são baseados em uma lógica mercantilista que entende uma floresta como um conjunto de partes independentes e intercambiáveis. Isso é muito diferente da visão de mundo dos povos indígenas e camponeses, que vêm a floresta como um todo interconectado e interdependente, inclusive com eles mesmos, e consideram que permitir a destruição e a fragmentação de uma área tão rica quanto o Atlântico tropical é um crime.

Teresa Pérez, teresap [at] wr.org.uy

Membro do Secretariado Internacional do WRM

(1) Ver relatório da Mining Watch Canada intitulado “Supporting Communication to the Special Rapporteur on the Rights of Indigenous Peoples”, https://justiceprojectdotorg1.files.wordpress.com/2012/03/supporting-communication-jcap-mw-dsg-final-english-1.pdf

(2) Análise econômica e distributiva da mineração no Panamá, The Nature Conservancy: https://www.conservationgateway.org/Documents/ANALISIS%20ECONOMICO%20Y%20DISTRIBUTIVO%20MINERIA%20PANAMA.pdf