Caminhos a seguir?

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O capital especulativo e seus atores interessados como bancos, consultores, grandes empresas, fundos de investimentos, outros atores aliados, como ONGs e muitas vezes nossos próprios governos, pretendem com o ´comércio em serviços ambientais´ se apropriar dos territórios dos povos para ´vender´ e lucrar. Com isso, a luta pelos direitos dos povos das florestas que delas dependem tende a se tornar mais complexo e difícil.

Como continuar essa luta? Seguem algumas possíveis pistas:

- Muitas comunidades que vivem em florestas, sejam elas camponesas, tradicionais ou indígenas, compartilham a preocupação em como conservar essas áreas, sobretudo quando as mesmas se tornam mais escassas e a necessidade por terras aumenta. Muitas vezes, elas exigem, sendo uma demanda justa, apoio do Estado para melhor garantir sua conservação.

As informações levantadas neste artigo apontam para que as comunidades, em vez de entrar em esquemas como do ´PSA´ e o ´comércio em serviços ambientais´, coletem todas as informações sobre o que é e representa a ideia de ´serviços ambientais´ e seu ´comércio´, fazendo debates com toda a comunidade. O presente texto tem exatamente o fim de alimentar esses debates.

E se os governos gastam recursos públicos com ajuda a grandes empresas e bancos, o mesmo dinheiro pode ser aplicado também em políticas públicas para ajudar comunidades que buscam conservar e recuperar suas áreas florestais, sem necessidade de transformar isso em mecanismos perversos como o ´comércio em serviços ambientais´, o que aprofunda o processo de mercantilização e financeirização da natureza.

- Uma caraterística comum do ´comércio em serviços ambientais´ e do ´mercado de carbono´ são a falta de transparência sobre este tipo de mecanismo. É de suma importância exigir, no seu país, informações das autoridades, dos parlamentares, sobre a regulamentação já aprovada e sendo discutida sobre esse tipo de atividade. Em países onde a legislação sobre ´comércio em serviços ambientais´ está sendo construído rapidamente, como no Brasil, há claras contradições com a constituição do país, por exemplo, quando os projetos de lei propõem a privatização de algo fundamental e de livre acesso para toda a população. Por exemplo, no estado do Acre, entidades da sociedade civil estão pedindo ao Ministério Público Federal entrar com uma ação de inconstitucionalidade contra a Lei Estadual 2.308/2010 que institui o Sistema de Incentivos a Serviço Ambiental do estado.

- A agricultura camponesa em quase todos os países do Sul, sofre de falta de apoio, políticas públicas, para se manter e fortalecer. Esse tipo de agricultura, praticada inclusive em áreas de florestas, sem que isso tenha sido uma ameaça à continuidade da floresta, tem possibilitado uma convivência e interação com a mesma. A ideia do ´comércio em serviços ambientais´ descarta essa convivência. Mais apoio em forma de políticas públicas para esse tipo de agricultura fortaleceria a segurança e soberania alimentar dessas populações e das regiões onde estão inseridas. Além disso, a agricultura camponesa já contribui, como a Via Campesina tem divulgado, com o ´esfriamento´ do planeta. Estados, em vez de conceder apoio às comunidades camponesas, muitas vezes financiam e facilitam a introdução do ´comércio em serviços ambientais´. Significa, gastar dinheiro público e, às vezes, assumindo novas dívidas financeiras com instituições internacionais como o Banco Mundial, quando esses oferecem ´incentivos´ para esse novo tipo de ´comércio´. O ônus fica novamente por conta do povo.

- a mercantilização e financeirização da natureza apontam para a importância de construir alianças mais amplas entre aqueles que combatem o sistema financeiro internacional, outras que lutam contra a privatização da natureza, e ainda outras que lutam diariamente por seus territórios e ecossistemas.

- uma aliança ampla e forte contrária à ´economia verde´ está sendo proposta através do convocatório rumo a Rio+20 (40). Busca concretizar uma agenda em conjunto de organizações e redes não governamentais e movimentos sociais, incluindo ações de solidariedade a comunidades impactadas por empresas que se apropriam de e degradam seus territórios, como é o caso da CSA no Rio de Janeiro, de propriedade das multinacionais Vale e Thyssenkrup, ou poluem o mar e afeta pescadores como a empresa petroleira Petrobrás. A agenda conjunta prevê também a realização da Assembleia dos Povos Afetados por projetos privatizantes e degradantes na véspera do Rio+20.

- é preciso continuar com mais força a luta para que as comunidades que conservam as florestas tropicais e dependem delas possam ter o direito e controle sobre esses espaços. Significa lutar pelo reconhecimento dos direitos desses povos sobre seus territórios, algo ainda inexistente ou insuficientemente garantido em muitos países da América Latina, África e Ásia. Em países onde já houve muitos avanços como Brasil, a tendência é de retrocesso nos direitos indígenas e nos direitos de outros povos tradicionais, enquanto cresce sem parar os esforços para criar um ´mercado global em serviços ambientais´.

precisamos continuar a resistência e a denúncia do capital financeiro e suas atividades especulativas. Apesar de a crise que afeta principalmente as maiores economias do mundo, quase todos os países e, sobretudo, seus governos continuam defendendo e inseridos nesse sistema. No entanto, aumentam, no mundo todo, as críticas e as mobilizações que clamam por mudanças profundas, sobretudo em relação à financeirização cada vez mais crescente da economia, e também da natureza, com uma crescente onda de privatização de tudo que ainda é público.  Por isso, é preciso continuar lutando forte contra a expansão dessa lógica do capital especulativo para que não se aproprie de áreas fundamentais para o futuro da humanidade, inclusive das florestas tropicais.

Cabe a todos denunciar cada vez mais as perversidades e contradições dessa lógica e seus impactos concretos nos territórios. Precisamos apoiar e fortalecer a resistência dos povos para que primeiramente seja garantido a eles o direito sobre seus territórios e para que se reverta o processo de privatização da natureza, também futuramente, garantindo livre acesso para as populações que sempre têm cuidado e usufruído dela.

Como disse a testemunha do Congo neste artigo: “..somos felizes com nossa floresta, porque nos permite conseguir tudo que precisamos”. E isso não tem preço.

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40 - http://wrm.org.uy/bulletin/173/Rio+20_and_beyond.html