Colômbia: os tropeços do projeto da Lei Florestal na Colômbia

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Talvez nenhum projeto de lei na Colômbia, sobre um assunto ambiental, tenha conseguido despertar tantas opiniões diveras e tanto revôo, como aconteceu com a discussão no Congresso Colombiano da Lei Geral Florestal, que foi aprovada por esta instituição no mês de dezembro. Foi tal a força dos argumentos e tal a resposta do ambientalismo colombiano, do movimento social e inclusive de parte dos meios de comunicação que, pela primeira vez, o presidente Álvaro Uribe Vélez manda de volta uma lei ao Congresso da República.

O projeto de lei foi promovido sob argumentos de que era indispensável “... para o desenvolvimento do país, a conservação e o manejo sustentável das florestas naturais, além do estabelecimento de plantações florestais”, já que estas são a guia fundamental para o progresso do setor florestal”. Por outro lado, insistiu-se em que, do potencial de 25 milhões de hectares, só 150.000 foram reflorestadas para uso comercial, isto é, 0.006 por cento das mesmas. O governo salientou que, por este motivo, o projeto é de essencial importância, pois não foi aproveitado até agora o imenso potencial florestal que temos no país. Talvez estes exemplos cheguem para alertar-nos, embora de forma mínima, sobre o espaço que tem ocupado o discurso argumentativo. Estas frases evidenciam que os defensores do projeto de Lei estão mais preocupados pelos aspectos comerciais do que pela conservação e proteção do meio ambiente.

Os argumentos que aduzem os defensores do projeto de Lei Floretal, desde seu início, localizaram-se em um espaço de interesse comercial. Argumentam que será possível aproveitar mais eficazmente o potencial florestal que tem o país, incrementando os dividendos monetários e incrementando o emprego. Porém, ainda neste âmbito, podemos pôr em dúvida se os benefícios econômicos pelos quais supostamente estão discutindo, são para o país ou, pelo contrário, existe um interesse obscuro de abrir as florestas da Colômbia para a exploração por parte das multinacionais. Pois já sabemos para quem é o negócio. Com a lei pretende-se promover as concessões com empresas nacionais e multinacionais com capacidade técnica e extrativa, que realizem uma exploração moderna e tecnificada.

Por outro lado, neste ponto surge a pergunta se a discussão sobre o florestal pode ficar subordinada a uma simples reflexão comercial. Isto é, se o âmbito de valoração no qual se abre o debate sobre o projeto de Lei Florestal só pode ser pensado desde os critérios do capital. Tal parece que esta discussão deve dar lugar a um espaço mais amplo de debate, pois neste não só devemos levar em consideração interesses econômicos, mas também éticos e existenciais. Conseqüência evidente quando se entendeu a vida como sagrada. Porém, durante o processo de discussão no Congresso do projeto de Lei, os defensores do Projeto de Lei Florestal, dentre eles o governo e, particularmente, o Ministério do Meio Ambiente, da Moradia e Desenvolvimento Territorial o o Ministério da Agricultura, desestimaram completamente abrir espaço para debate e conformaram-se com desacreditar aos seus oponentes de forma sistemática.

A estratégia de desacreditar, na discussão do projeto de Lei, tomou diversos matizes, dentre eles e, talvez o último, por parte do ministro da Agricultura, consistiu em afirmar que os argumentos da oposição são tão somente uma “Mitologia surrealista”. Talvez nunca entendamos com profundidade, se tem, o significado dessa asseveração, talvez só queria dizer que os argumentos dos oponentes procuram plasmar o encontro da realidade com o mundo dos sonhos. A realidade é que foram tantos os argumentos claros e contundentes das organizações que nós colocamos em contra do projeto que o Presidente da República viu-se pressionado a enviá-lo de volta para o Congresso da República ao objetar 11 artigos da Lei que o Congresso Nacional aprovara.

E é que são muitos os eventos que fazem ilegítimo o projeto de lei. Como primeira medida, é possível mencionar o desconhecimento total que se tinha das comunidades afro-descendentes, indígenas e camponesas, que são as proprietárias de mais da metade das florestas do país. Porém, o direito constitucional que tem negritudes e Indígenas de Consulta, apenas se fizeram uns quantos foros, onde as recomendações recolhidas não foram levadas em consideração. Os Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente argumentaram que: como a essas comunidades não são afetadas negativamente, não era imperativo consultá-las.

A ilegitimidade do projeto também pode ser explicado porque também não permitiram que a comunidade acadêmica, as organizações ambientalistas e setores da sociedade civil que trabalham para a proteção do meio ambiente participassem. Além disso, o Congresso da República desconheceu as vozes de protesta do Procurador e do Órgão de Controle.

Desta forma, passo a passo, a maioria do Congresso desconheceu as vozes do povo, que é o único capaz de legitimar qualquer norma. Até esse ponto, o governo continuou com esta estratégia que, na votação do projeto de lei, em dezembro de 2005, aos congressistas oponentes desse projeto, que reclamavam uma e outra vez com força, nunca lhes deram o uso da palavra. Além disso, ali mesmo um pedido feito previamente para votar artigo por artigo, não foi levado em consideração. Desta forma, foi aprovado o projeto de Lei 264, com uma votação de 81 votos favoráveis e 11 em contrário, para dar passo à sanção presidencial, onde foi revogado.

Esta pequena menção deste processo não só cria profundas dúvidas sobre o projeto, mas também nos deixa um sabor amargo na boca pelas estratégias que foram utilizadas para aprová-lo. Já que no seu intento de desacreditar à oposição, só tem desconhecido completamente ao outro, mostrando a sua incapacidade de criar um espaço amplo de debate onde, não só se tomem critérios econômicos e comerciais, mas também éticos e existenciais. É muito triste como foi aprovado este projeto de lei, já que algumas pessoas que votaram a favor admitiram desconhecer o que estavam aprovando; outros, nem sequer souberam definir em que consistiu o “vôo florestal”. "Vôo Florestal", eixo fundamental do projeto, este sim um conceito da “mitologia surrealista”, que separa o solo das árvores e demais elementos da terra, que realiza uma separação que só no sonho seria possível entender, de dois elementos inseparáveis, o caule da árvore e o solo que é a sua base. Talvez aqui tão somente nos encontramos de novo com a esquizofrenia capitalista.

Por: Diego Andrés Martínez, Censat Agua Viva - Amigos da Terra Colômbia, correio eletrônico: bosques@censat.org