A mulher e os recursos florestais: dois casos centro-americanos

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Embora na Guatemala 20% das áreas de floresta estejam sob sistemas de áreas protegidas, o contínuo avanço da fronteira agrícola, produto da distribuição desigual dos meios de produção -em particular, da terra-, fomentou a pobreza e a exclusão social. Essa situação agrava-se nas áreas rurais, onde a maior parte da população depende das florestas.

Os grupos indígenas e camponeses aparecem como os mais afetados, sendo pressionados a colonizar e habitar ecossistemas frágeis, carentes de serviços básicos. Mesmo assim, grupos de mulheres têm procurado formas de organização alternativas para o manejo dos recursos naturais nos sistemas florestais. No presente artigo, apresentaremos dois casos, um emoldurado num ecossistema de coníferas, no ocidente do país (no departamento de Huehuetenango), outro, no norte, num dos ecossistemas de floresta tropical mais importantes da região messo-americana, na Reserva da Biosfera Maia, departamento de Petén.

A informação apresentada provem dos estudos de caso realizados na área de Meio Ambiente da Faculdade Latinoamericana de Ciências Sociais, FLACSO, Sede Acadêmica Guatemala, como parte de suas atividades de pesquisa nas linhas de florestação comunitária e institucionalidade local. Na região de Huehuetenango, grupos de mulheres indígenas kanjobal organizam-se para o manejo florestal por meio do programa de incentivos florestais com apóio do governo, através do Instituto Nacional de Florestas (INAB, em espanhol). Começando com um projeto para melhorar as condições sociais das mulheres kanjobales afetadas pelo conflito armado interno, as mulheres se organizam através da Associação de Mulheres Eulalenses para o Desenvolvimento Integral Pixan Konob AMEDIK Coração do Povo. Desde que o projeto foi iniciado, 143 hectares foram reflorestados e 246 foram manejados sob sistemas de regeneração natural. As florestas são manejadas em parceria com três municipalidades, por estarem localizadas em áreas comunais e terras municipais. Nesse caso, as municipalidades aparecem como responsáveis perante o INAB e recebem entre 1,5% e 2% do total desembolsado através dos incentivos florestais. Essa sinergia tem permitido aos grupos de mulheres terem acesso aos incentivos, pois sem o título de propriedade no poderiam aceder aos mesmos. Cerca de 500 famílias participam atualmente no projeto, e durante os últimos quatro anos a AMEDIK tem recebido cerca de US$ 100 mil como parte dos incentivos. Na Reserva da Biosfera Maia, existem concessões comunitárias que representam contratos de arrendamento por 25 anos para que grupos organizados realizem o manejo florestal integral, representando aproximadamente 400 mil hectares parcelados em 15 concessões comunitárias. Essa região é considerada, no âmbito mundial, como uma das mais importantes que estão sendo manejadas pelas comunidades indígenas e camponesas.

Porém, o processo de inclusão das mulheres na região tem sido lento demais, e marcado em princípio pela oposição generalizada dos homens, que alegam que a partilha da renda gerada não é justa, existindo dois membros da mesma família dentro de uma organização. Assim sendo, existem grupos organizados sem sócias mulheres e outros onde as esposas ou filhas podem conseguir o direito de sócias somente depois da morte do marido ou na falta de filhos homens. Na atualidade, as mulheres que participam nas concessões representam aproximadamente 15%. Os grupos de mulheres que trabalham nas florestas dedicam-se à extração de produtos não madeiráveis, como o vime (Monstera sp), o bayal (Desmuncus sp.) e o xate (Chamaedorea sp.), principalmente para trabalhar em artesanato ou móveis, enquanto outras preferem participar em projetos de turismo ecológico. As atividades de manejo florestal caracterizam-se pelo trabalho duro e, portanto, correspondem aos homens.

Concluindo, se bem é verdade que a questão de gênero está sendo levada em conta e que a inclusão da mulher está sendo promovida por entidades para o desenvolvimento externas, existem certos fatores que constituem um impedimento ao envolvimento da mulher em atividades de manejo florestal. Por um lado, temos o sistema de distribuição de terras praticado no passado que não permite à mulher ter acesso aos títulos de posse da terra. Outras variáveis, como a educação e a saúde, indicam que as mulheres indígenas constituem os grupos mais vulneráveis. Embora os grupos como a AMEDIK tenham conseguido ter acesso ao manejo florestal sob incentivos florestais, isso não teria sido possível sem o acompanhamento das municipalidades. Por outro lado, enquanto o manejo florestal evolui do aproveitamento da madeira para um manejo florestal integral, as mulheres que participam nas concessões comunitárias ainda terão que percorrer um longo caminho para alcançar seu reconhecimento e participação nas atividades alternativas de manejo de recursos não madeiráveis e artesanato.

Por: Iliana Monterroso, FLACSO-Sede Académica Guatemala; correio eletrônico: imonterroso@flacso.edu.gt