O “crescimento” liderado pela infraestrutura, promovido pelo Banco Asiático de Desenvolvimento na Índia e na região do Mekong (1)

O Banco Asiático de Desenvolvimento (ADB, em inglês) é fundamental para a geração de demanda e de condições para a privatização generalizada em praticamente todos os setores na região da Ásia-Pacífico, desde transporte, energia e desenvolvimento urbano até agricultura, água e finanças. Baseado em um “crescimento” liderado pela infraestrutura, o setor empresarial é impulsionado agressivamente nos projetos apoiados pelo ADB, por meio de parcerias público-privadas (PPPs), empréstimos, cofinanciamento e uma série de outros instrumentos financeiros.

Sob discursos de crescimento inclusivo e ambientalmente sustentável e de integração regional, o ADB apoia projetos para acelerar o comércio e o investimento, principalmente em países com grandes recursos naturais, apesar do dano ambiental reconhecido e da alienação das populações. Entre eles, alguns dos principais são os projetos de infraestrutura de transporte, energia e tecnologia da informação e comunicação, bem como as políticas e os sistemas regulatórios e financeiros voltados a atrair capital privado para investimento em projetos de infraestrutura.

Em sua estratégia para 2020, o ADB promove um papel mais importante para o setor privado em financiamento de infraestrutura, seja como patrocinador de projetos ou promovendo formas de investimento comumente usadas nos mercados financeiros, como títulos e fundos de capital (para entender essas formas de investimento diferentes, ver também o Boletim 181 do WRM). O ADB também promove “corredores econômicos”, na forma de bolsões de alto desenvolvimento de infraestrutura para atrair investimentos privados e promover o fluxo de livre comércio e investimento.

A Sub-Região do Grande Mekong (GMS, em inglês) é o principal programa de integração regional do ADB. Iniciada em 1992, a GMS visa transformar a região do Mekong em uma área de livre comércio e investimento de porte regional, alimentada e liderada por operações do setor corporativo. A maior parte do investimento de capital tem sido em transporte (rodoviário, ferroviário, aéreo e hidroviário), energia, telecomunicações, turismo, comércio, agricultura e no fortalecimento do setor empresarial. Desde 1992, foram concluídos ou estão sendo implementados projetos de infraestrutura que totalizam cerca de 10 bilhões de dólares. Entre eles estão a modernização da rodovia Phnom Penh (Camboja)-Ho Chi Minh (Vietnã) e o Corredor Econômico Leste-Oeste, que se estenderá do mar de Andaman até Da Nang, no Vietnã (1).

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Corredores de transporte da Região do Grande Mekong
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A estratégia dos corredores econômicos também está sendo apoiada na Índia. No estado indiano de Chhattisgarh, o ADB vai fornecer 430.500.000 dólares para apoiar seis corredores de transporte e redes de estradas que passam por florestas e áreas indígenas, próximas a ricos depósitos de carvão e minerais. Um dos projetos mais destrutivos em que o ADB está envolvido é o Corredor Industrial Deli-Mumbai (DMIC, em inglês), um megaprojeto de infraestrutura que vai de Deli a Mumbai, passando por seis estados e cobrindo uma extensão total de 1.483 km. O DMIC inclui a construção de super-rodovias, usinas de energia, portos, ferrovias, aeroportos, cidades satélites, cidades-ímã, núcleos industriais, parques tecnológicos, etc. Estima-se que o investimento necessário atualmente para operacionalizar o DMIC seja de 90 bilhões de dólares, cuja maior parte é proveniente do governo japonês, com um envolvimento significativo do ADB. Embora o governo indiano seja o “proprietário” do DMIC, 75% dos projetos do corredor serão de propriedade privada, através de PPPs.

Apesar do atrativo discurso do ADB sobre redução da pobreza, o DMIC na Índia, por exemplo, vai tomar as terras até 200 km em ambos os lados do Corredor Especial de Cargas Deli-Mumbai, enquanto as 11 regiões de investimento e as 13 áreas industriais propostas exigirão terras entre 100 e 250 km2 cada uma. Aproximadamente 180 milhões de pessoas serão afetadas e centenas de milhares de hectares de terras de agricultura e pecuária serão perdidas para grandes corporações que vão trazer poucos benefícios para as populações locais. O DMIC irá captar a água que é necessária aos agricultores para cultivar alimentos e às comunidades rurais para suas vidas diárias. Estudos mostram que os rios da região do DMIC já estão sob intenso estresse e não podem resistir a mais exploração (2). A aquisição de água e terras para o DMIC irá desalojar milhões de pessoas, destruir ambientes e recursos naturais preciosos e desencadear conflitos violentos entre as comunidades locais e as forças de segurança do Estado.

Além disso, o programa de empréstimos do ADB na Índia para 2013-2015 será alocado a quatro principais setores de infraestrutura: transporte, energia, cidades, e agricultura e recursos naturais, bem como a dois setores transversais: finanças e desenvolvimento de competências. A Estratégia de Parceria do País para 2013-2017, que está sendo formulada, incluirá o desenvolvimento de corredores econômicos de alta prioridade, a criação de mercados para financiar infraestruturas e a promoção da “integração” regional, através da plataforma de Cooperação Econômica Regional do Sul da Ásia (SASEC, em inglês) (3).

Espera-se que os governos adquiram terras, garantam acesso a depósitos de água e de minérios, facilitem o financiamento, deem proteção e garantias contra riscos, e ponham em prática políticas e regulamentações necessárias para facilitar as operações das empresas privadas. Mas a participação nas decisões sobre esses projetos não é estendida às comunidades locais, cujas vidas e meios de subsistência são prejudicados por elas. O Segundo Projeto de Desenvolvimento Rural da Região Montanhosa de Chittagong, em Bangladesh, provavelmente exigirá a aquisição de terras das comunidades locais, que constituem mais de 40% da população indígena do país.

Como afirma um artigo sobre “Desenvolvimento e os Recursos Comuns do Mekong”: qual a influência que as pessoas da região têm sobre as escolhas relacionadas ao desenvolvimento? Até onde elas estão envolvidas nas decisões que afetam seu bem-estar e o de seus filhos? Como podem lidar com as mudanças que acontecem, que costumam ir muito além de seu controle individual imediato? Como podem imaginar e tornar realidade um futuro melhor do que este modelo de desenvolvimento centrado na economia, que lhes está sendo constantementeimposto e que muitos são convidados a aceitar com fé cega, na esperança de que as suas necessidades e aspirações sejam atendidas?” (4)

O modelo de desenvolvimento do ADB é predatório, antidemocrático, discriminatório e destrutivo. Este modelo garante benefícios para as corporações e classes altas, mas empobrece trabalhadores, pequenos agricultores, pescadores, comunidades indígenas e populações pobres rurais e urbanas. Aqueles que resistem às injustiças do modelo ou as apontam são rotulados como contrários ao desenvolvimento e ao Estado, sendo perseguidos e encarcerados. O ADB não pode ser reformado, ele deve ser parado. É necessário que unamos forças para resistir ao modelo de desenvolvimento extrativo e destrutivo do ADB e sua agenda de privatização.

Informações extraídas e adaptadas do artigo de ShalmaliGuttal, “Pursuing Privatization: the ADB Unchanging Vision of Development”, Focus on the Global South,http://focusweb.org/content/pursuing-privatization-adbs-unchanging-vision-development

 

Notas:

(1) http://www.adb.org/countries/gms/overview

(2) Delhi-Mumbai Corridor, A WaterDisaster in theMaking?  RomiKhosla e VikramSoni, Economic and PoliticalWeekly, 10 de março 2012. VOL  XLVII n. 10

(3) AsianDevelopment Bank and India FactSheet: http://www.adb.org/sites/default/files/pub/2013/IND.pdf

(4) Mekong Commons, Development and the Mekong Commons,http://www.mekongcommons.org/development-and-the-mekong-commons/