O Grande fraude do “manejo florestal comunitário” na Índia – avaliação crítica de um projeto em andamento em Andhra Pradesh, financiado pelo Banco Mundial

Imagem
WRM default image

Apesar dos anos de controvérsia que rodeiam os projetos florestais do Banco Mundial na Índia, o Banco está pressionando com o fim de levar a cabo grandes planos para abrir o caminho para grandes empréstimos para mais projetos florestais en vários estados.Em 2005, o Banco está começando projetos piloto de “manejo florestal comunitário” e “manejo florestal participativo”, nos estados de Madhya Pradesh e Jharkhand. Esses projetos piloto têm o objetivo de anteceder importantes empréstimos para projetos florestais de grande porte em todo o estado.O Banco Mundial alega que tem aprendido de erros passados originados de seus empréstimos para florestamento social e manejo florestal conjunto na Índia.Relatórios recentes do Banco enfatizam que agora está procurando apoiar o governo indiano para passar de enfoques prévios de manejo florestal conjunto para um novo enfoque de “manejo florestal comunitário” (vide, por exemplo, PROFOR Periodic Update – março de 2005).

Enquanto os planos para esses novos projetos florestais ganham ritmo, o Banco tem estado implementando um Andhra Pradesh Community Forestry Management Project – APCFMP (Projeto de Manejo Florestal Comunitário em Andhra Pradesh) de cinco anos, desde finais de 2002.Esse projeto, que está financiado com um empréstimo de USD 108 milhões, é descrito pelo Banco como uma intervenção “Guiada pela Comunidade” que visa a reduzir a pobreza e a “empoderar” as comunidades para tomar decisões autônomas a respeito do manejo florestal em terras alocadas a comitês de proteção florestal de povoados já existentes - Vana Samrakshana Samithi (VSS). Muitos dos 5000 VSS envolvidos no projeto de manejo florestal comunitário foram estabelecidos de acordo com um controvertível Projeto de Manejo Florestal Conjunto prévio (1994-2000) que foi muito criticado por envolver despejos forçados de povos tribais que receberam pouca ou nenhuma compensação.

Em virtude dos problemas com o projeto anterior financiado pelo Banco, a forte oposição ao segundo empréstimo do Banco entre muitas ONGs relacionadas com as florestas e o desenvolvimento em AP foi prevenida depois que as cartas de protestas das ONG garantiram um compromisso do Banco que:(i) o desenho do projeto e a política de reassentamento seriam fortalecidas para proibir expressamente e defender-se contra mais reassentamentos forçados de famílias dependentes das florestas e (ii) famílias reassentadas sem compensação de acordo com o projeto anterior de manejo florestal conjunto seriam reabilitadas devidamente como condição do contrato de empréstimo.

Assegurou-se àquelas pessoas cépticas sobre o segundo empréstimo do Banco que a continuação do projeto seria significativamente diversa do projeto anterior de manejo florestal conjunto, porque a intervenção do manejo florestal comunitário visaria a garantir que os VSS comunitários tomassem a dianteira nas decisões de manejo florestal, enquanto o departamento florestal do estado atuaria principalmente como “facilitador” (Documento de Avaliação do Projeto – PAD: página 5).Aquelas pessoas que promoveram o projeto pensaram que o manejo florestal comunitário ajudaria a reduzir a pobreza entre os VSS comunitários participantes, aumentando seus direitos legais a participar dos benefícios da venda dos produtos florestais.

Depois de mais de dois anos de implementação, como tem resultado esse projeto e quais têm sido as experiências das comunidades afetadas? Há sinais de que o Banco esteja promovendo um manejo florestal comunitário genuíno?Está o Banco aprendendo realmente lições e promovendo um novo enfoque? Um esforço para responder essas perguntas em julho de 2004 foi feito quando Samata e o Forest Peoples Programme (FPP) trabalhou com nove comunidades no distrito costeiro central e do NE de Andhra Pradesh para documentar suas experiências e opiniões sobre o projeto até esse momento.O resto deste artigo salienta algumas das principais constatações da avaliação independente.

Constatações preliminares de uma avaliação indenpendente de uma ONG:

As discussões com as comunidades, ONGs relacionadas com as florestas e ativistas confirmam que apesar de que a revisão do plano de ação de reassentamento resultou em defensas de procedimento mais fortes contra o despejo forçado, restam lacunas que obstaculizarão a devida reparação em caso de agravos e bloquearão a compensação de terras por terras.Para maior indignação das ONGs que fizeram campanhas para as condições do empréstimo a respeito do reassentamento, o documento final revisado feito público em maio de 2004 estabelece que as terras de acordo com o projeto prévio foram abandonadas voluntariamente.Também sustenta que se espera que até 50% das 16190 famílias potencialmente afetadas no projeto de manejo florestal comunitário escolham entregar voluntariamente suas terras ao Departamento Florestal.As ONGs e líderes da comunidade impugnam vigorosamente essa afirmação e apontam que as duas consultas públicas sobre o plano de ação de reassentamento em 2000 e em 2003 registram claramente que a maioria dos povos tribais e outros povos dependentes das florestas definidos pelo Andhra Pradesh Forest Department – APFD(Departamento Florestal de Andhra Pradesh) como “usurpadores” sob nenhuma circunstância entregarão voluntariamente sua terra “usurpada” aos VSS.Uma condição adicional chave do empréstimo ainda não tem sido cumprida:depois de mais de dois anos, essas famílias que sofreram um impacto adverso pelo anterior projeto de manejo florestal conjunto ainda não têm sido identificadas e ainda não tem sido compensadas.

Além disso, há severas críticas da Tribal Development Strategy - TDS (Estratégia de Desenvolvimento Tribal) financiada pelo projeto, que foi redigida por estranhos, sem acordo prévio e pouco conhecimento dos líderes adivasis.Os povoadores com os que se falou como parte da avaliação disseram que nunca tinham visto o documento final e não conheciam seu orçamento nem seus objetivos.Ao serem informados de seu conteúdo fundamental, os líderes afirmam que rejeitam fortemente a estabelecida “filosofia subjacente do componente tribal” que é “reduzir a dependência das tribos das florestas para sua subsistência econômica” (através do fornecimento de trabalho jornaleiro com o departamento florestal e alternativas de renda baseadas no mercado).

As organizações da sociedade civil também são críticas a respeito de que o projeto não pode promover as reformas necessárias para um manejo florestal comunitário.Elas apontam que as Revisões à Lei Florestal de Andhra Pradesh de acordo com o projeto são estreitas e restringidas à revisão de normas para eleições de VSS, participação nos VSS e divisão de benefícios. Eles salientam que a intervenção do Banco não trata as maiores iniqüidades e injustiças contidas na legislação nacional como a Lei de Conservação Florestal de 1980 e portanto é incapaz de promover reformas genuínas e abrangentes, e não faz nada para tratar as reclamações das comunidades dependentes das florestas para o reconhecimento de seus direitos de propriedade sobre terras cultivadas e de florestas.

Além disso, membros das comunidades adivasi se queixam de que não têm sido empoderadas no projeto, já que a maioria das decisões sobre manejo florestal ainda são tomadas pelo APFD. As pessoas estão descontentes, já que suas prioridades e decisões a respeito do manejo florestal estabelecidas em resoluções dos VSS são rotineiramente ignoradas ou rejeitadas pelo APFD, enquanto assuntos cruciais, como os conflitos sobre a posse da terra não estão sendo tratados no projeto.Em muitos povoados, o APFD está pressionando os VSS para que assinem contratos com firmas privadas de florestamento e celulose, para estabelecer plantações de eucalipto e teca nas terras dos VSS, contra a vontade dos VSS e membros da comunidade.Os membros dos VSS que ousam desafiar as instruções do Departamento Florestal são ameaçados com sanções legais e/o exclusão dos benefícios do projeto.Os benefícios do projeto para os povoadores se têm limitado a trabalho jornaleiro ocasional e temporário para o APFD.Resulta que o componente de “manejo florestal comunitário” do projeto, restringe-se estreitamente à preparação de microplanos para o desenvolvimento dos povoados e “tratamentos” de manejo florestal dos VSS.A maioria desses planos estão sendo redigidos por pessoal do APFD e são considerados sub-planos dos próprios planos florestais do governo.

Também há provas sinistras de que o governo estadual e o APFD estão usando os VSS para manipular comunidades e abrir pela força o acesso comercial a terras de florestas indígenas para serem exploradas por indústrias extrativas particulares, incluindo companhias de plantação, de celulose e mineradoras.Os funcionários do APFD estão fazendo promessas duvidosas de programas de divisão dos benefícios com os VSS em um esforço para estabelecer arrendamentos para mineração e plantação em terras comunitárias.Por essa razão, a legitimidade dos VSS como instituições comunitárias representativas está sendo questionada.As ONGs locais em Andhra Pradesh que seguem a pista da política florestal concluem que os VSS estão transformando-se em um instrumento do governo que está sendo primariamente utilizado para controlar as comunidades e neutralizar sua oposição à colonização e expropriação de suas terras por empresas comerciais.

Em virtude de todos esses problemas, as comunidades e as ONGs de apoio que inicialmente aceitaram o projeto APCFM (com receio) estão ficando amargamente desiludidas:

“O projeto de manejo florestal comunitário é como uma pílula coberta com açúcar, que é amarga no interior.O Departamento Florestal explica que o manejo florestal comunitário é diferente do anterior projeto de manejo florestal conjunto em Andhra Pradesh –quando as comunidades eram tratadas apenas como mão-de-obra para fazer os trabalhos do Departamento Florestal e para proteção florestal.Mas o que vemos agora depois de dois anos é que o manejo florestal comunitário é apenas vinho velho em garrafa nova. Há pequenas mudanças, mas basicamente esse projeto é manejo florestal conjunto com outro nome e as pessoas não têm mais poder para decidir como utilizar a floresta.O Departamento Florestal ainda ordena como vai utilizar-se a floresta e as terras...” [Sanjeeva Rao, Velugu Association, distrito de Srikakulam, AP, julho de 2004]

“Apoiamos às ONG em AP envolvidas no manejo florestal conjunto e manejo florestal comunitário porque genuinamente achamos que isso traria benefícios para os povos adivasi e outras comunidades dependentes da floresta em AP.No entanto, com esse primeiro projeto de manejo florestal conjunto assistido pelo Banco Mundial houve sérios problemas com o reassentamento involuntário, e o Departamento Florestal subtraiu muita terra das comunidades tribais em nome dos VSS.Estávamos muito descontentes e nos queixamos amargamente ao governo de AP e ao Banco Mundial.Na preparação do novo projeto de manejo florestal comunitário, eles garantiram que as coisas mudariam, mas agora percebemos que o projeto de manejo florestal comunitário ainda outorga o controle quase total ao Departamento Florestal e a instituição VSS ainda está prejudicando as autoridades tradicionais no povoado e as comunidades não estão bem informadas…”[Devullu P, Sanjeevini Rural Development Society, distrito de Vishakhapatnam, AP, julho de 2004]

Essa avaliação inicial desse Projeto Florestal do Banco constata que o Banco está violando sua políticas sobre Florestas, Povos Indígenas e Reassentamento.Ao mesmo tempo, o contrato de empréstimo não está sendo sustentado e aqueles que perderam terras de cultivos rotacionais (podu) de acordo com o anterior projeto do Banco, queixam-se de que estão sofrendo perdas severas e crescentes, e querem a devolução de suas terras tradicionais.Por sua vez, o Banco ainda está desembolsando fundos para o projeto, que de acordo com os ativistas e líderes comunitários, mostra que o Banco não tem mudado suas características e não está aprendendo lições…

A principal conclusão até agora entre os principais ativistas florestais em AP é que o enfoque parcial do Banco projeto por projeto a nível do Estado está desviando a atenção dos chamamentos populares por reformas de governança e legais mais amplas, requeridas para promover um manejo florestal comunitário genuíno, através do reconhecimento dos direitos de propriedade dos adivasi e outras comunidades dependentes da floresta na Índia.

Os ativistas salientam que os sérios problemas com o APCFMP deveriam ser uma advertência gritante para aquelas comunidades às que lhes prometeram um “novo enfoque” em novas propostas de projetos florestais do Banco, planejados em outros estados.

O presente artigo foi compilado por Tom Griffiths [tom@forestpeoples.org] do Forest Peoples Programme junto com Ravi Rebbapragada e Bhanu Kalluri de Samata [Samatha@satyam.net.in].

O relatório de avaliação completo, compilado por Samata e o FPP vai ser concluído em breve, e estará disponível sob pedido em: info@forestpeoples.org

Por mais informação sobre os planos para o setor florestal do Banco Mundial na Índia, vide http://www.forestpeoples.org